quarta-feira, 1 de junho de 2011

Adaptação à mudança climática em base comunitária: oportunidades para os biocombustíveis?


Acabou a “5th International Conference on Community-Based Adaptation to Climate Change” em Dhaka, Bangladesh, organizada pelo International Institute for Environment and Development (IIED) e o Bangladesh Centre for Advanced Studies (BCAS). Na ocasião, mais de 390 participantes de ONGs, governos, instituições internacionais e da academia discutiam como levar estratégias sucedidas de adaptação em comunidades locais (community based adaptation em inglês, ou CBA) além de fases de projetos pilotos e fazer a integração com políticas públicas.

Os debates envolveram discussões sobre vulnerabilidade e resiliência, impactos da mudança do clima sobre a saúde, custo-benefício e eficiência de projetos, questões de gênero ou a complementaridade entre projetos de adaptação e de desenvolvimento sustentável. Tudo isso náo somente na própria conferência (dias 28.3.-31.3.), mas também em oito visitas de campo que precederam o evento em Dhaka (dias 25.3.-27.3.) e em quais os participantes conheciam de perto iniciativas de adaptação em comunidades locais frente uma crescente de degradação ambiental.

Por exemplo, na região de Khulna, agricultores familiares sofrem com a salinização das suas terras agrícolas devido a contínuos processos de desmatamento nas Sundarbans, a maior floresta manguezal halófila do mundo que, durante a maré alta, está quase inteiramente coberto de água salgada. O desmatamento também está responsável para ciclones mais devastadores na região porque a função de proteção das Sundarbans está cada vez mais ameaçada. O IPCC previu no seu últimos relatório um aumento na frequência de ciclones na região, e isso pode tornar a condições de vida dos agricultores intoleráveis.

A imagem de satélite (Fonte: Wikipedia, 2011, http://en.wikipedia.org/wiki/Sundarbans) mostra a floresta em área protegida. O Sundarbans aparece verde profundo, cercado ao norte, por uma paisagem de terras agrícolas, que aparecem em verde claro, cidades, que aparecem em tan, e córregos, que são azuis.

Quais então os possíveis respostas? O consenso sobre onde estamos em termos de CBA pode ser sumarizado em 5 itens:

  1. Mudança climática não é mais um “simples” problema ambiental ou de poluição ambiental: ela inclui dimensões sociais, econômicas, financeiras, discussões sobre equidade e diretos humanos. Isso se aplica particularmente para adaptação, pois as comunidades ou regiões mais vulneráveis à mudança do clima frequentemente não são responsáveis pelo problema. Além disso, diferente da mitigação, que é global, adaptação precisa ser feito no local.
  2. Projetos CBA precisam levar tais diferentes dimensões em conta: inclusão do conhecimento local e gerenciamento participativo, justiça ambiental e social, eficiência econômica e eficácia, inovações locais etc. são ingredientes necessários para gerar processos sustentáveis de adaptação. Tais processos podem englobar décadas para ser realizados.
  3. Para ampliar estratégias de sucesso em CBA não deve se pensar somente em replicar uma idéia ou um projeto numa outra comunidade, mas também em integrar as experiências nos diferentes níveis de governança e de ação. Ou seja, é importante ampliar horizontal (escala de projetos) e vertical (mainstreaming). Isso mais ainda pelo fato que governos raramente são pioneiros em estratégicas de adaptação ou em outras áreas... Assim, a política não precisa somente de idéias de projetos, mas também precisa-se mostrar como podemos replicar modelos em outras regiões com próprias características.
  4. Projetos de CBA são frequentemente projetos dispersos, locais e pouco integrados com outras iniciativas ou políticas públicas. Porém, é importante reformular projetos de CBA de forma mais estratégica para reduzir redundâncias e criar sinergias com projetos e políticas existentes.
  5. Finalmente, não se pode esquecer a mitigação! Somente adaptação vai ser insuficiente e caro para lidar com os impactos da mudança do clima.
Como vimos na visita de campo não tem falta de projetos inovadores em comunidades locais que conseguem criar resiliência aos problemas atuais até nas regiões mais carentes e vulneráveis. Simples projetos de captação de água doce, sistemas de prevenção de desastres ou divulgação de boas práticas agrícolas já conseguem reduzir a vulnerabilidade local.

Porém, as discussões entre os diferentes participantes na excelente conferência também mostravam que permanece incerto se as adaptações incrementais no momento serão suficientes no futuro. Ao final, enquanto a mudança do clima é somente adicional às vulnerabilidades do presente, segundo os modelos do IPCC ela mostrará seu potencial devastador no futuro com maior irregularidade climática e maior frequência de eventos extremos, o que pode anular estratégicas de adaptação hoje chamadas de boas práticas. Somente focando em pequenos passos pode ser insuficiente para uma efetiva e sustentável adaptação.

De qualquer modo adaptação à mudança climática demandará soluções holísticas e pesquisas transdisciplinares envolvendo, entre outros, ciências naturais e sociais, sem esquecer da economia assim como a engenharia para lidar com o imenso tamanho do problema.

Os biocombustíveis podem fazer parte disso? Ainda tem pouco pesquisa em qual medida, por exemplo, o biodiesel a partir da agricultura familiar poderia reduzir vulnerabilidades em “hotspots” climáticos e sociais, como por exemplo o semi-árido nordestino ou na região amazônica. Um atual projeto coordenando pelo Centro de Estudos Integrados do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (Centro Clima), parceiro do NUGOBIO, e financiado pelo MCT/CNPq espera dar mais resultados sobre este assunto.

Para o resumo da conferência CBA5 ver: http://www.iisd.ca/ymb/climate/cba5/ (em inglês)

--

Martin Obermaier
Doutorando, Programa de Planejamento Energético - COPPE/UFRJ
Pesquisador, Laboratório Interdisciplinar de Meio Ambiente (LIMA)
Tel/fax: +55 21 2562-8805
http://www.ppe.ufrj.br, www.lima.coppe.ufrj.br

Nenhum comentário: